17/12/2007

À moda italiana

Produtores traçam plano de ação para resgatar tradição vitivínicola no sul de Minas

O município de Andradas, no sul de Minas Gerais, foi conhecido como a “terra do vinho” na primeira metade do século passado. Os italianos, que vieram trabalhar nas lavouras de café, trouxeram a tradição da cultura de uvas e da produção de vinho para a região. Nessa época, cerca de 90 adegas se estabeleceram na cidade. O solo fértil e o clima de serra, a 920m do nível do mar e média de 19°C, contribuíram para o fortalecimento da vitivinicultura. “O vinho produzido em Andradas tinha muita semelhança com o vinho europeu”, afirma o presidente do Sindicato da Indústria do Vinho do Estado de Minas Gerais (SindVinho), Ítalo Francisco Bertoli.

A gerente da Secretaria de Turismo de Andradas, Vivian Caldas Magalhães Franco, conta que o município foi pioneiro na produção de vinhos no Brasil. Mais de 550 famílias de imigrantes italianos vieram para a região no final do século XIX. Esses italianos começaram a cultivar a uva e produzir vinhos para consumo próprio. Com isso, foram surgindo diversas adegas.

No entanto, a falta de incentivos e da introdução de novas tecnologias de produção, como a enxertia, fez com que o setor se enfraquecesse no município. Entre os anos 1990 e 2005, na contramão da tendência do Estado, a área plantada de uva em Andradas reduziu 37%, enquanto em Pirapora, a 613 km, o crescimento foi de 352%.

Hoje, há apenas 120 hectares plantados de uva e somente sete adegas em Andradas. Os vinicultores importam do Rio Grande do Sul 80% da uva necessária para a produção de vinho, o que interfere na qualidade e no preço, encarecendo o produto. Anualmente, são produzidos 5 milhões de litros. A maior parte é do tipo mesa, atendendo a preferência dos consumidores de Minas Gerais e São Paulo. Apenas uma vinícola processa vinho fino.

Muitos vitivinicultores utilizam a metodologia da poda de videiras, ou seja, mantêm a tradição italiana no cultivo de uvas. Isso também dificulta a projeção do setor na região. Na técnica tradicional, a videira demora de dois a três anos para começar a produzir. O porta-enxerto, de três a quatro anos, mas com melhor custo-benefício. A Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) vende muda enraizada por cerca de R$ 3,50 e o porta-enxerto por até R$ 1.

Projeção – Em 2006, os produtores e a prefeitura de Andradas se uniram ao Sebrae/MG, Instituto Euvaldo Lodi de Minas Gerais (IEL/MG), Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG) e SindVinho para aumentar a produtividade vitivinícola. Traçaram um plano de ação e, até 2016, esperam duplicar a produção de vinhos, com no mínimo 50% das uvas provenientes de Andradas. Além disso, querem ampliar a área de plantio para 580 hectares, criar uma central de produção de mudas com 5 hectares em três anos, fortalecer o enoturismo e construir 20 cantinas familiares.

O gerente do Sebrae no Sul de Minas Gerais, Marden Márcio Magalhães, diz que o projeto resgatará a tradicional plantação de uva e fabricação de vinhos, além de introduzir técnicas modernas de produção. “O nosso foco é trazer novas tecnologias e mais conhecimento sobre o mercado para os produtores, além de realizar uma pesquisa sobre a identidade do vinho de Andrada e promover intercâmbios entre as adegas do município e as de outros Estados”, afirma.

O enoturismo será um dos principais aliados para alavancar a produção de vinhos no município. Entre as estratégias, está a criação de cantinas familiares. O coordenador de projetos do IEL/MG, Thadeu Chaves Tolentino Neves, explica que “as cantinas familiares são pequenas produções de vinhos. O produtor cultivará uvas finas, do tipo Cabernet Sauvignon, Merlot, Malbec e Syrah, e também produzirá de 30 a 50 mil litros de vinho artesanal. Essas uvas se adaptam bem à região e produzem um vinho de qualidade e alto valor agregado.”

A iniciativa ampliará a variedade de vinhos produzidos na região e atrairá turistas. Os visitantes poderão degustar os vinhos à moda italiana, feitos principalmente com a uva Jacques, e conhecer o processo de fabricação. Além disso, haverá outras atrações e atividades que promoverão o setor, como a Festa do Vinho, que acontece há mais de 40 anos e traz ainda danças típicas da Itália. Segundo Vivian Caldas, este ano, 32 mil pessoas prestigiaram o evento, que ocorreu em praça pública e durou quatro dias.

Algumas adegas já estão preparadas para receber os turistas. A Casa Geraldo criou um restaurante e um cardápio especial para os visitantes degustarem seus vinhos. Foi construído um acesso ao local de processamento das uvas, assim os visitantes podem ver de perto a fabricação do vinho que irão provar. “Além de vender vinhos ao mercado, as adegas alcançaram um público diferente, interessado em conhecer a história da vitivinicultura”, destaca a gerente.

Tradição - O vinicultor Ítalo Francisco Bertoli conta que a família fabrica vinho no Brasil há quatro gerações. A tradição começou com seus avôs, cujas famílias já produziam vinhos na Itália. Os Bertoli estão no ramo em Andradas desde 1986. Foi seu pai, Jácomo Bertoli, quem constituiu a adega da família, a J. Bertoli, em 1905. Entre as marcas, vinhos J. Bertoli e Nau Sem Rumo, primeiro vinho madeira produzido no País. “Hoje, produzimos cerca de 70 a 80 mil litros de vinho de mesa, utilizando apenas a uva local”, ressalta.

A adega J. Bertoli também oferece visitas guiadas a turistas e grupos escolares, contando a história do vinho em Andradas e mostrando sua linha de produção. Há ainda jardins onde os visitantes podem aproveitar o clima de montanha do município e saborear as bebidas.

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